A Associação Brasileira dos Advogados do Povo Gabriel Pimenta – ABRAPO vem a público denunciar o caráter do processo movido contra os manifestantes Caio e Fábio, que consiste numa verdadeira campanha contra os direitos do povo lutar pelos seus direitos.
Em 06 de fevereiro de 2014, Caio e Fábio participavam de uma das inúmeras manifestações no Rio de Janeiro contra o aumento das passagens, duramente reprimidas por um contingente policial e militar fortemente armado.
Caio, a seu turno, nem tinha ido para a manifestação. Tinha ido pegar o trem na Estação da Central do Brasil, assim como milhares de trabalhadores, a qual se encontrava fechada em razão da confusão instalada pela intensa repressão policial contra os manifestantes, em meio a qual Caio e muitos outros populares se juntaram.
Para a autodefesa do povo, é comum, e manifestamente necessário para manter a integridade dos manifestantes, o uso de rojões, fogos juninos, e outros artefatos capazes de conter a agressão policial e o avanço das tropas sobre o povo.
Assim, no referido dia, durante a escalada do tensionamento entre a manifestação e a repressão, Caio e Fábio, que não se conheciam, dispararam um rojão contra a investida policial, tendo, supostamente, atingido, pela imprevisibilidade do trajeto do foguete, o jornalista Santiago Andrade.
Por essa tragédia, inequivocamente acidental, Caio e Fábio estão sendo acusados de homicídio doloso duplamente qualificado, como se tivessem considerado e aceito o risco de causar uma fatalidade. Ainda, de terem realizado o disparo com a intenção de desvirtuar o caráter da manifestação, e agindo de modo a impossibilitar a defesa da vítima, que estava de costas.
Isso é uma distorção completa e desonesta dos fatos!
Primeiro que, se estava de costas para os manifestantes, é porque filmava a atividade policial. Ainda, não havendo intenção de atingi-lo, não havia como planejar impedir sua defesa. Por fim, a motivação era justamente proteger a manifestação e seus integrantes!
Como não bastasse a acusação montada para criminalizar os manifestantes, junto às milhares de ações no Brasil de 2013 e 2014, fabricadas para conter a justa rebelião, o processo seguiu seu curso eivado de falhas e nulidades, as quais levantam perguntas cruciais: qual a razão do desaparecimento das últimas gravações realizadas por Santiago, que demonstravam o que estava sendo filmado no momento do acidente? Santiago foi registrar a agressão pretendida pela repressão, e não é interessante exibir essas imagens? Essas imagens justificam a atuação de Caio e Fábio? Ou elas mostravam outra coisa, e por isso não podem vir a público?
Ou então, por que seu corpo foi cremado em tempo recorde, de modo a impossibilitar a produção de mais laudos sobre a causa da morte, como é o procedimento a ser feito em crimes de homicídio desde o assassinato da juíza Patrícia Accioly? Sumiram com sua camisa, que foi usada para estancar o ferimento na hora dos primeiros socorros? A intenção é esconder a real causa da morte do jornalista? Algo mais poderia ter contribuído, no meio de um fogo cruzado? Porque a Band juntou ao processo imagens imprestáveis de 15 segundos e que além de não corresponderem às imagens que o jornalista filmava na hora do trágico acidente que o vitimou, ainda eram imagens editadas e baixadas do Youtube?
Um dos policiais, que se encontrava no local e depôs em juízo, afirmou: “ele estava me filmando”.
O sumiço dessas provas e do corpo de delito, atentam de forma mortal contra o direito de ampla defesa e do contraditório dos acusados, fulminando o devido processo legal, através da quebra da cadeia de custódia da prova, e indicam uma possível anulação do processo.
Todas essas perguntas carecem de respostas que não sabemos se virão. Mas, temos o dever de denunciar a covardia que representa pegar esses jovens como “exemplo” para desencorajar o povo a lutar pelos seus direitos, usando da repressão, da opressão, da intimidação e da criminalização.
O que temos consciência é que o Estado fez de tudo para conter o fluxo de protestos despertado pelas jornadas de 2013 no Brasil, e a insustentabilidade das mentiras e engodos dos megaeventos e seus gastos estratosféricos, para mascarar o descaso com as condições de vida do povo, cada dia mais vilipendiado e massacrado, sem acesso à saúde, educação, trabalho digno, transporte de boa qualidade e condições básicas de vida.
Assim, o acidente foi recebido como uma grande oportunidade para desmobilizar as massas, e culpá-las pela violência, sendo que, seu real responsável é o Estado, para que o povo saia das ruas.
Criminalizar Caio e Fábio é criminalizar o povo em luta por direitos, e negar os métodos encontrados para as justas reivindicações, em resposta à sistemática injustiça contra a população.
Parte da finalidade dessa sana acusatória é criar precedentes para futuros enquadramentos de manifestantes.
Fiel a sua consigna de defender o direito do povo lutar pelos seus direitos, usando dos meios necessários, de acordo com sua autodeterminação, a ABRAPO se solidariza com os perseguidos políticos, com seus familiares e amigos e se ombreia com a campanha em apoio à Caio e Fábio, e a suas defesas legais, assim como, denuncia mais essa farsa acusatória montada para criminalizar e desmobilizar o povo em luta por direitos!
VIVA AS JORNADAS DE 2013 e 2014!!!
PELO FIM DO PROCESSO CONTRA CAIO E FÁBIO!!!
PELO DIREITO DO POVO LUTAR PELOS SEUS DIREITOS!!!
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS ADVOGADOS DO POVO GABRIEL PIMENTA – ABRAPO
01/12/2023
Arte disponível no instagram da campanha. Siga: @liberdadecaioefabio