Em julho de 2022 completa 40 anos do covarde assassinato de advogado do povo Gabriel Pimenta, defensor dos camponeses, ocorrido em Marabá, no Estado do Pará. Fruto da morosidade do Poder Judiciário, mandantes e executores devidamente identificados desse crime ficaram impunes. O processo que durou décadas e terminou prescrito é uma prova inconteste da relação espúria entre o latifúndio e o Poder Judiciário Brasileiro.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi peticionada em 9 de novembro de 2006, pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) tendo como partes interessadas a família de Gabriel e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Marabá. A Comissão concluiu que a
investigação foi marcada por omissões do Estado, que as autoridades não agiram com a devida diligência ou dentro de um prazo razoável.
Os peticionários alegaram a violação dos artigos I (direito à vida), XVIII (direito à justiça) e XXII (direito de associação) da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem (DADDH) e dos artigos 8º (garantias judiciais) e 25 (proteção judicial), em conexão com o artigo 1.1 (obrigação de respeitar os direitos), todos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) devido ao fato de o Estado não ter adotado medidas preventivas para garantir o direito à vida da vítima e também pelo fato de o crime ter ficado impune até aquela data.
A LUTA DE GABRIEL PIMENTA EM DEFESA DOS CAMPONESES DE MARABÁ
No início da década de 1980, Gabriel Sales Pimenta, formado em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), mudou-se para Marabá (PA), onde se integrou à luta dos camponeses pela posse da terra. Trabalhou incansavelmente na defesa e organização dos trabalhadores rurais, colaborando na criação de sindicatos e associações. Foi representante legal do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Marabá e um dos fundadores da Associação Nacional dos Advogados dos Trabalhadores da Agricultura.
Tornou-se um dos primeiros advogados a ganhar uma causa no Judiciário em favor dos camponeses no conflitante sul do Pará, anulando os efeitos de uma medida cautelar em um processo de reintegração de posse que havia determinado o despejo de 158 famílias, o que contrariou os interesses de latifundiários locais, no caso, Manuel Cardoso Neto, irmão do ex-governador de Minas Gerais, Newton Cardoso. Gabriel Pimenta passou a sofrer constantes ameaças de morte. No dia 18 de julho de 1982, em Marabá, foi assassinado com três tiros de revólver nas costas, disparados a curta distância pelo pistoleiro José Crescêncio de Oliveira, contratado pelo chefe de pistolagem José Pereira Nóbrega, sócio de Nelito. Gabriel Pimenta tinha 27 anos de idade.
Baseando-se em evidências apuradas, o inquérito policial concluiu pela culpa do latifundiário e seu jagunço, mas o processo de arrastou por décadas e nenhum dos acusados foi a júri popular. Em 2006, o Tribunal de Justiça do Estado do Pará decretou a extinção do processo em razão de prescrição com impunidade para os assassinos
A morte de Gabriel Pimenta revela o descumprimento das obrigações internacionais do Estado brasileiro em prevenir violações contra defensores (as) de direitos humanos e proteger o direito à vida e a integridade pessoal para que os (as) defensores (as) exerçam livremente suas atividades sem sofrer atentados, ameaças ou represálias.
Gabriel Pimenta foi um mártir no campo da advocacia de uma situação de violência do latifúndio e conluio do Estado brasileiro que tem ceifado a vida de muitos trabalhadores Brasil
afora. A situação que levou a sua morte continua fazendo parte da realidade do campo brasileiro.
Mas o sangue derramado por Gabriel Pimenta segue inspirando a luta que o campesinato e o povo brasileiro travam por livrar o país de todos os que querem impor, através do terror, uma ordem que desrespeita os direitos do povo a terra e ao trabalho. Ele é o patrono da ABRAPO-Associação Brasileira dos Advogados do Povo Gabriel Pimenta, e seu legado se encontra vivo nesse coletivo de advogados.
Conclamamos a todas as entidades democráticas e as pessoas que lutam por um Brasil democrático e progressista que acompanhem o julgamento pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. A presença mostrará que o caso Gabriel não pode passar impune pois reforça todos aqueles que no Brasil se beneficiam da manutenção da violência do latifúndio e da cumplicidade de agentes do Estado.
O julgamento ocorrerá em uma das sessões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, nos dias 22 e 23/03/22, das 11:00 às 15:00 (aproximadamente), através dos canais da Corte IDH no face e no YouTube.